À medida que a polarização social se intensifica, onde as narrativas de desigualdade dominam o debate público, surge um eco preocupante vindo de um dos mais tradicionais jornais europeus. Bertrand de Saint Vincent, escrevendo para o Le Figaro Magazine, lançou uma perspectiva contundente e, para muitos, chocante: os ricos estão se tornando uma "espécie ameaçada". Esta não é uma hipérbole retórica vazia, mas sim uma observação perspicaz sobre a confluência de um novo e agressivo regime fiscal e um discurso público de hostilidade sem precedentes.
A Caçada Fiscal e o Discurso da Perseguição
Do ponto de vista da economia política, o que estamos testemunhando é a consolidação de uma estratégia de política fiscal que transcende a mera redistribuição. Saint Vincent descreve um cenário onde novos impostos são introduzidos, impostos existentes são inflacionados, e até mesmo medidas fiscais temporárias são sorrateiramente tornadas permanentes. Essa voracidade fiscal, justificada pela necessidade de financiar déficits ou combater a desigualdade, assume, contudo, uma natureza punitiva. A riqueza, antes vista como um potencial motor de investimento e criação de empregos, é agora primariamente tratada como um estoque a ser drenado.
O mais alarmante é o contexto social e midiático que envolve essa ofensiva fiscal. O autor francês identifica um "ódio" onipresente e um foco público massivo nos ricos, que não raro resvala para a perseguição. Tornaram-se os bodes expiatórios convenientes para uma miríade de problemas sociais e econômicos. É mais fácil e politicamente rentável apontar o dedo para o indivíduo "ultrarrico" do que enfrentar as falhas estruturais dos sistemas de bem-estar social ou a ineficiência da gestão pública.
Ecos da História: Do Fiscal à Guilhotina Moral
A análise de Saint Vincent atinge seu ponto mais frio ao traçar paralelos históricos que, embora provocativos, não podem ser ignorados. A sugestão de que o atual clima de condenação pública e escrutínio incessante pode ser o prenúncio de algo mais sombrio — lembrando a exibição pública de "inimigos do povo" na China maoísta — é um aviso severo.
Não estamos falando, é claro, de violência física iminente, mas de uma execução moral e econômica. Quando manchetes provocativas e o discurso político transformam indivíduos como Bernard Arnault (e outros empreendedores e investidores de sucesso) em figuras quase demoníacas, a sociedade está sendo preparada para aceitar não apenas uma tributação elevada, mas uma verdadeira desapropriação moral e social da elite. A riqueza é deslegitimada; o sucesso é criminalizado.
📝 Nota: A inveja, historicamente, tem sido uma força social destrutiva. Quando a crítica construtiva à desigualdade se transforma em ódio à riqueza em si, a sociedade corre o risco de cortar o próprio galho em que se senta.
As Consequências Não Intencionais
Do ponto de vista econômico, a perseguição pública, combinada com a agressividade fiscal, tem uma consequência prática e inevitável: a fuga de capital e talento. Quando um ambiente se torna hostil, os detentores de capital móvel e de alto valor líquido procurarão jurisdições mais acolhedoras. Isso não só priva o país de origem de uma base fiscal vital (os impostos mais altos acabam arrecadando menos, um clássico da Curva de Laffer), mas também o esvazia do espírito empreendedor, do capital de risco e da filantropia que frequentemente acompanham a grande riqueza.
A perspectiva de Saint Vincent nos força a confrontar uma verdade desconfortável: o debate sobre a desigualdade deve ser balizado pela racionalidade econômica e pela ética social, e não pelo ressentimento. A busca por justiça social não pode ser transformada em uma caça às bruxas, sob o risco de instaurar um cenário de "pesadelo" onde a própria capacidade de uma sociedade gerar riqueza e prosperidade para todos é paralisada pelo ódio e pela perseguição.
É imperativo que os legisladores e os formadores de opinião abandonem a retórica polarizadora e reconheçam que, ao demonizar sistematicamente o sucesso, correm o risco de aniquilar a "espécie" que, com todos os seus defeitos, continua a ser a principal fonte de capital de investimento, inovação e, em última análise, de progresso econômico.
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