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quarta-feira, outubro 22, 2008

VIVER & ESCREVER


Acabei de ler o livro Viver & Escrever da maravilhosa escritora Edla Van Steen. Na realidade esse é uma obra com depoimentos de grandes nomes das letras do Brasil a exemplo de Mario Quintana, Orígenes Lessa, Nélida Piñon, Dias Gomes, Jorge Amado entre tantos outros. Edição da L&PM Pocket, você encontra esse tomo nas boas livrarias e bancas de revistas. Na introdução a Edla observa: “Tem sido realmente um privilégio ser contemporâneo de tão significativos nomes da literatura brasileira”. E a Edla soube como ninguém estrair verdades das almas desses escritores por ela entrevistados; eu nem diria que foram entrevistados mas sim tiveram uma conversa em que declarações e detalhes íntimos foram sendo revelados.
Quero pinçar algumas dessas declarações e fazer os meus comentários para que vocês possam sentir a delícia que é esse livro, livro esse que recomendo, se você aprêcia a boa leitura.
Mario Quintana – “Ser poeta não é uma maneira de escrever. É uma maneira de ser. O leitor de poesia é também um poeta.” Interessante ler uma afirmação dessas do Mario, por ele nos apresentar a poesia e o ser poeta como estilo de vida e não como alguém simples e vulgar, colocando o leitor (aprêciador) de poesia como (também) um poeta. Conheço um senhor do interior da Paraíba que jamais escreveu uma linha, porém publicou um livro reunindo poesias de amigos, e por isso todos o trata por poeta, não por ser, mas por aprêciar e patrocinar de forma eficaz a poesia. E Mario ainda afirma que o poeta “não é um relações públicas e sim um relações íntimas.” Li (não lembro onde) que "ser poeta é carregar o mundo em si”, acho que um mundo de intimidades. Poesia é leitura para intimidade, decorre daí a declaração do Mario ser tão cabível, por colocar o poeta quase na qualidade de confessor.
Orígenes Lessa – Declarou escrever seus textos com canetas BIC por ter alergias a todo tipo de máquina ou mecanismo, “por mais simples que seja”. São particularidades tão interessantes por fazer com que reconheçamos as nossas próprias manias. Antigamente eu também não conseguia escrever nas jurássicas máquinas de escrever,achava que as idéias não fluíam bem. Só com muito treino e auto-imposições é que consegui me libertar das famigeradas canetas BIC e deixar as minhas idéias correrem pelas pontas dos dedos.
Orígenes fala que nos tempos negros do Brasil ele lia muitos textos subversivos, entre os quais um “Jesus Cristo era anarquista”.Eu queria entender o que era um texto subversivo; aquele tempo era tão mais emocionante! Não é? Hoje em dia não existe mais isso, nada é subversivo, impróprio, proibido ou censurado. Estou com vontade de ir visitar algum país onde isso ainda exista, só para saber como é. Ou melhor não? Deixemos pois essas experiências com o senhor Lessa e aqueles do seu tempo.
Nélida Piñon – Nélida Piñon a imortal da Academia Brasileira de Letras nos oferece uma pílula do que era a sua infância. “Não fui propriamente travessa. Segundo depoimento familiar, havia em mim uma avidez que não tenho agora como reconstituir. Queria fazer de tudo, sem chamar a atenção. Desde subir às árvores, criando entre os galhos um ninho amigo, onde ficava horas a ler, até escrever uma revistinhas que em seguida passava a meu pai, ao preço de cinco cruzeiros. Pagava-me ele a imaginação e a iniciativa comercial. Enquanto aplicava-me modesta lição de realidade.” É bom sabermos esses detalhes dos nossos escritores preferidos,é através dessas declarações que passamos a perceber ser eles não apenas divindades das letras mas também pessoas humanas que tiveram uma infância alegre, normal e principalmente num ambiênte familiar que lhes propiciaram as suas majestosas criações.
Dias Gomes – Grande novelista e teatrólogo e antes de tudo um homem das letras. Mesmo sendo íntimo das palavras não quis enveredar pela poesia, embora as tivesse escrito e jamais divulgado: “Não ultrapassavam o valor de um pileque ao som de um tango”. Dias tinha razão, quando se tem fama é preciso ter senso crítico para saber o que pode e o que não pode. Dias Gomes teve senso crítico de perceber que a sua poesia não era nada original, segundo ele (a sua poesia) poderia tirar o foco daquilo que ele dominava facilmente: criar estórias com personagens ricos para o teatro e televisão.
Jorge Amado – Jorge Amado, um dos mais famosos e traduzidos escritores brasileiros. Faz uma declaração no livro da Edla que considero das mais importantes: “Não basta melhorar as condições materiais do homem, faz-se necessário garantir também sua liberdade de pensamento, seus direitos de cidadão. Socialismo sem democracia é socialismo capenga, que facilmente pode se transformar em ditadura da pior qualidade, voltada para os interesses dos donos do poder e não para os interesses das grandes massas populares”. Amado que era de idéias socialistas tinha toda razão quando fala de um dos direitos mais prementes da pessoa humana que é o de se comunicar livremente, ter suas idéias e opiniões respeitadas e não ser cerceados nos seus direitos de ir e vir. Como diz a música do Arnaldo Antunes, Marcelo Fromer e Sérgio Brito em sua música COMIDA: “a gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte”. Esse é um direito básico de um indivíduo e o Amado tocou tão bem nesse quesito, liberdade de pensamento, de expressão e de jogar com idéias.
Edilberto Coutinho – E prá finalizar, uma frase do não tão conhecido paraibano Edilberto Coutinho; jornalista, contista, ensaísta e tradutor. Também entrevistado por Edla: “O bom conto tem que agarrar o leitor desde a primeira frase, não permitindo que ele se demita do texto até o ponto final. É na leitura que o texto se realiza”. Essa é uma boa dica para quem quer se aventurar pelo mundo das letras.
P.S. – Não deixem de comprar o ótimo livro da Edla Van Steen.


Texto e Foto: ENÉAS BISPO

Um comentário:

  1. Aprendi uma coisa, nem todo administrador é um bom escritor de Best sellers sobre Marketing, e nem todos escritor de Livros magníficos da Administração, são especificamente bons administradores...hehehe...Muito Bom!

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